O caminho para isso é a luta, como a dos médicos e trabalhadores da TAP, que obrigou o governo a recuar, respetivamente, na redução do valor das horas extraordinárias e no corte dos salários. Esta é mais uma razão para participarmos na greve geral de 22 de março e da manif em Lisboa, entre o Rossio e o Palácio de S.Bento, a partir das 16 horas, convocada pela Plataforma 15 de Outubro.
A intervenção da troika ainda não completou um ano e Portugal vai de mal a pior. Já estão previstas para este ano uma recessão de 3,3% e uma taxa de desemprego de 14,5%, ambas superiores às anunciadas anteriormente. Recessão pior do que a de Portugal, só na Grécia. E as más notícias não acabam por aí: a troika assumiu que o pico da dívida pública portuguesa, afinal, não será em 2013, mas talvez em 2014. Isso significa que um novo plano de austeridade não é uma previsão irrealista, pelo contrário.
Também aponta nesse sentido a avaliação do novo representante do FMI na troika, Abebe Selassie, que contrariou o prognóstico do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, ao dizer que considera difícil um regresso de Portugal aos mercados em setembro de 2013. A recuperação da economia por via das exportações também não será uma tarefa fácil, já que o maior parceiro comercial português, a vizinha Espanha, responsável por mais de 25% das nossas exportações, está em recessão e sob a ameaça de um intervenção da troika.
Austeridade mata
Para além dos números, os efeitos das medidas de austeridade na vida das pessoas estão a ser dramáticos. As empresas não param de anunciar despedimentos, e o atraso no pagamento dos salários é constante. Só entre finais de fevereiro e início de março, o grupo empresarial Plataforma SGPS, considerado um dos maiores da Beira Interior, anunciou que vai aplicar uma suspensão temporária de trabalho (lay-off) que abrangerá a totalidade dos seus 230 trabalhadores; a alemã Makro ameaçou com despedimento coletivo os seus 1.500 trabalhadores, caso não aceitem rescindir o seu contrato de trabalho; em Viana do Castelo, a sobrevivência dos Estaleiros Navais continua ameaçada pela recusa do governo em garantir financiamento para a viabilização de contratos para a construção de navios; e na Bonvida Porcelana, na Batalha, os seus 170 trabalhadores estão desde setembro sem receber salários.
Além de perder o emprego e ver os ordenados a minguar, os portugueses estão a perder a vida em consequência das medidas do governo. Entre fevereiro e março morreram mais de 1000 pessoas do que o normal nesta altura do ano. Para o presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, Mário Jorge Santos, não resta dúvida, a culpa é da austeridade. “Conheço pessoas que deixaram de ir ao hospital, de comprar medicamentos e de fazer alguns exames complementares de diagnóstico por causa das taxas moderadoras”, disse ele. A isto devemos acrescentar o aumento da taxa de eletricidade, que impede os mais pobres, em geral idosos, de se aquecerem no inverno. Já há cerca de 100 mil pessoas com o salário penhorado em Portugal.
Há quem ganhe com a crise
Má para a maioria, há no entanto os que continuam a lucrar apesar da crise. É o caso da Jerónimo Martins, que apresentou no ano passado um resultado líquido superior em 21% ao de 2010. A mesma empresa que transferiu mais da metade do seu capital para a Holanda para fugir dos impostos. É o caso também da banca, generosamente alimentada pelo Banco Central Europeu com dois empréstimos, realizados no curto espaço de três meses, no valor total de mais de 1 bilião de euros à taxa de juro de 1%. É o caso, ainda, do BPN, cujo processo de privatização está a custar aos cofres do estado até agora mais de 1.000 milhões de euros. No total, o buraco do BPN já alcançou os 5.443 milhões de euros.
Luta conquista resultados
Não há saída para os trabalhadores e a juventude que não seja reagir às medidas que o governo e a troika estão a impor. Foi o que fizeram os 300 trabalhadores de manutenção da TAP que se concentraram em janeiro em frente à entrada do edifício da empresa em protesto contra os cortes salariais e a suspensão dos subsídios de férias e de natal. Foi o que fizeram os pilotos dessa mesma companhia, ao ameaçar com greve caso não fossem revistas essas orientações do governo. Diante da luta desses trabalhadores, o governo acabou por recuar e anunciar a suspensão dos cortes salariais, impostos ao restante setor empresarial do Estado desde janeiro. O mesmo resultado foi obtido na Caixa Geral de Depósitos. Esta foi uma vitória importante desses trabalhadores, apesar de o corte nos subsídios de férias e de natal ser mantido.
Os médicos, por sua vez, conquistaram a manutenção do valor das suas horas extraordinárias, ameaçado pelo governo, após uma série de plenários em vários hospitais, convocados pelo grupo “Médicos Unidos” criado no Facebook. Os plenários decidiram-se pela recusa das horas extraordinárias que ultrapassassem o limite legal caso o governo não voltasse atrás.
É com esse espírito de luta que devemos participar da greve geral convocada pela CGTP para 22 de março e da manifestação organizada pela Plataforma 15 de Outubro nesse mesmo dia, às 16 horas, no Rossio, em Lisboa.
Cristina Portella