As acampadas e as gigantescas mobilizações que têm ocorrido pelo mundo afora têm em comum o fato de serem democráticas, lutarem contra o sistema capitalista e não serem dirigidas pelas estruturas sindicais e partidárias tradicionais.
É no contexto de uma crise económica e social sem precedentes, só comparável à de 1929, que surgem no início deste ano as revoltas no norte de África e no mundo árabe. Da Tunísia a rebelião alastrou-se ao Egito, Iémene, Síria, Líbia, etc. O mundo assistiu emocionado à queda de Mubarak e viu a juventude e o povo – através das novas tecnologias, da luta nas ruas e do acampamento na Praça Tahrir – serem a vanguarda da contestação ao regime ditatorial e ao aumento do custo de vida.
O rastilho da revolta nos países árabes acabou por atingir também a Europa. Portugal foi o primeiro a reagir com a gigantesca manif da Geração à Rasca a 12 de Março. No seguimento deste protesto, a plataforma “Democracia Verdadeira já”, no Estado Espanhol, marcou uma manifestação para o dia 15 de Maio de carácter internacional. No final desta manifestação, um sector decidiu “tomar a praça” e fazer um acampamento na Puerta del Sol, em Madrid.
Inicia-se então, influenciada pelo acampamento da Praça Tahrir, uma onda de acampadas pelo Estado Espanhol e depois pelo mundo, tendo como vanguarda a juventude. Até o centro do capitalismo mundial foi recentemente atingido com a “Occupy Wall Street”, que rapidamente se estendeu a várias cidades dos Estados Unidos.
Portugal também foi contagiado pela forma de luta das acampadas, tendo existido várias pelo país, como a do Rossio, mas sem nunca alcançar o nível de participação das existentes no Estado Espanhol ou em Wall Street. No caso específico da Acampada do Rossio, esta reuniu o sector que não ficou satisfeito com a falta de continuidade da luta a seguir ao 12 de Março, ou seja, a juventude mais radicalizada e descontente que queria ir mais longe do que trocar de governo.
Mas as acampadas são apenas parte de um mesmo fenómeno mundial que se expressou também nas manifestações da Geração à Rasca e no 15 de Outubro. Atualmente, esse movimento popular, democrático e independente de partidos e sindicatos é representado, em Portugal, pela Plataforma 15 de Outubro, o 15-O.
Que fenómeno é esse?
As acampadas e as gigantescas mobilizações que têm ocorrido pelo mundo afora, inclusive em Portugal, têm em comum o fato de serem contra o sistema capitalista e os respetivos governos que adotam medidas contra o povo e não serem dirigidas por nenhuma estrutura sindical e partidária, nomeadamente as tradicionais – apesar de partidos também fazerem parte desses movimentos e poderem expressar-se abertamente.
Por estarem desenquadrados dos aparatos tradicionais, este movimento e as suas manifestações não são controlados burocraticamente, são democráticos e permitem a intervenção de todos em assembleias populares.
Outra importante característica é que esse movimento é dirigido fundamentalmente pela juventude, o setor mais afetado pela precariedade, o desemprego e a falta de futuro, o que não impede que dele participem pessoas de todas as idades. Nele estão jovens e trabalhadores precários que não encontram nos sindicatos – na maior parte das vezes estruturas fossilizadas e burocráticas – um local que os ouça e organize para lutar pelas suas reivindicações.
Dele também faz parte um grande setor que não se revê nos partidos tradicionais, inclusive na esquerda, não acredita no parlamento nem na democracia burguesa. A procura de uma democracia “real”, e não a formal exercida nas eleições e pelos partidos no parlamento, é uma das imagens de marca desse movimento.
Preconceito antipartidário
É verdade que há alguns setores no seu interior que têm uma postura sectária em relação aos partidos, criticando-os indiscriminadamente independente das posições que defendam ou da sua história. Mesmo divergindo dessa posição devemos considerar absolutamente normal que ela exista. Afinal, são mais de 80 anos de esmagamento burocrático feito em nome do comunismo e do socialismo por parte do estalinismo e dos partidos comunistas em todo o mundo. E são, também, mais de 100 anos de traição sob a batuta da social-democracia e dos partidos que fazem do parlamento a sua principal tribuna. A juventude e os trabalhadores estão fartos de serem enganados também por aqueles que dizem representa-los e defender.
Unidade para lutar contra o governo
Este processo de reorganização do movimento social é extremamente progressivo porque está em luta contra os respetivos governos e políticas de austeridade e reúne uma grande parcela da juventude e dos trabalhadores, nomeadamente precários e desempregados, que não estava até então ativa na luta política.
Desta forma, coloca em causa as organizações tradicionais “acomodadas” ao sistema e faz pressão para que se mexam. Um exemplo importante foi a greve geral convocada pela CGTP e UGT três dias depois das manifestações do 15 de Outubro.
O papel da esquerda e dos sindicatos deve ser o de apoiar este movimento, não para controlá-lo, mas para convergir com ele na luta contra o governo e a austeridade. Nesse sentido, foi errada a postura da CGTP de convocar uma manifestação para 1 de outubro, depois de várias organizações já terem convocado a manifestação de 15 de outubro. O correto seria fazer convergir ambas as iniciativas numa única e forte manifestação, e não dividi-la.
É urgente que este pólo de contestação – o 15-O – permaneça vivo e que os trabalhadores, estudantes e o povo em geral saiam à rua, participem das manifestações e concentrações convocadas e da greve geral de 24 de Novembro.
T.C. e C.P.