Comissão Política divide o Bloco de Esquerda

Já foi em Julho que reuniu uma auto-denominada tendência maioritária do Bloco de Esquerda. Quatro dirigentes do BE, entre eles Fernando Rosas, que se auto-apresentam como independentes (não se sabe do quê nem de quem), convocaram um plenário da Moção A (segundo nome da tendência maioritária) e que contou com a presença (vindos de todo o país) de cerca de 250 militantes do Bloco.

 1. O Bloco de Esquerda sofreu em Junho deste ano uma pesada derrota nas eleições legislativas. Perdeu perto de 300.000 votos e metade do seu grupo parlamentar e, acima de tudo, a pequena vantagem, histórica diga-se, face ao PCP, voltando a ficar atrás deste partido em votos e deputados. Causas do ‘tsunami’ eleitoral bloquista? Segundo Francisco Louçã e a maioria da Comissão Política, essencialmente, porque o país vinha girando à direita desde as eleições presidenciais. Ah, e já agora, este catastrófico resultado eleitoral nada tem que ver com o apoio dele próprio e do BE ao candidato de Sócrates às presidenciais em Janeiro, de seu nome Manuel Alegre. Segundo a direção do BE também houve um “outro erro”: não terem acudido à reunião com a troika. Tirando estas razões, aqui e acolá também se reconhece que sobrestimaram a resistência da população ao memorando com a troika. Resumindo e concluindo: o BE tinha estado muito à “esquerda” da situação política e, por isso, foi penalizado.

2. Pois nós temos opinião contrária. O BE não esteve à “esquerda” da conjuntura política, mas sim aquém das necessidades das largas camadas da população que estavam fartas do governo de José Sócrates. As pessoas, algumas centenas de milhares de trabalhadores, queriam ver Sócrates fora do poder. E penalizaram os dois partidos que estiveram mais perto do governo ou que estiveram juntos numa mesma campanha presidencial, em torno de um mesmo candidato (Alegre): o PS e, natural (e lamentavelmente), o Bloco de Esquerda. Mas a Comissão Política do BE não quer reconhecer este fator crucial e recusou-se a convocar uma convenção extraordinária para analisar a hecatombe eleitoral. Mesmo perante a insistência de centenas de bloquistas, de vários quadrantes internos, para que se convocasse essa convenção extraordinária e para que se renovasse a direção do Bloco, a todos a Comissão Política respondeu com a transformação (inédita) de uma direção eleita recentemente numa convenção de novo em Lista A (e numa tendência) de modo a convocar a sua mini-convenção, obstruir e travar a verdadeira convenção que estava a ser reclamada internamente e, pior ainda, dividindo abertamente o Bloco, condenando todos os que não comungam da Moção A a ficar de fora da vida prática do Bloco. Mais, a reunião já referida, da igualmente chamada tendência maioritária, votou, como se fosse a Mesa Nacional do BE, o calendário de discussão de todos os problemas e debates internos do Bloco. Em conclusão, a vida interna do BE, que já era fraca, acabou de vez. A Mesa Nacional reuni-se em fins de Setembro, mas tudo já está decidido desde o plenário de Julho.

3. Por fim, poder-se-á perguntar, a serviço de que política estão todas estas manobras antidemocráticas? É simples e resume-se a três vetores: (a) renegociação da dívida pública; (b) manutenção do Bloco como um partido essencialmente eleitoral, demitindo-se de construir uma verdadeira alternativa anticapitalista no terreno concreto das lutas sociais, onde tudo se decidirá sobre este capitalismo selvagem e em declínio acelerado; e, por fim, (c) total ausência de uma verdadeira democracia interna. Não haverá convenção extraordinária, não haverá alteração de políticas e, muito menos, haverá uma alteração na liderança e de rostos (salvo algumas – poucas – operações de cosmética).

4. O Bloco está a deixar de ser um partido anti-sistémico, está a continuar a ser um partido cada vez mais institucional e pouco irreverente, tudo o que faz mais falta na atual situação política em que temos uma direita agressiva no poder. Pelo nosso lado, continuaremos a dar a batalha por alterar este rumo do Bloco, mas estaremos mais concentrados nas lutas sociais, na construção de uma alternativa anticapitalista e atuante. Que tenha a coragem de dizer que a dívida não é pagável nunca, que, mesmo para uma eventual renegociação da dívida, teria de haver de imediato a suspensão do pagamento da mesma e dos juros exorbitantes que estão a penalizar toda a economia e a transformar o país num monstro de desemprego e sem futuro. Falta uma esquerda como foi o Bloco nas origens, vamos manter-nos fiel a esse projeto.

Gil Garcia

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