O que é o lítio?
O lítio é um metal alcalino que possui várias valências. Distingue-se dos demais metais por ser o mais leve. É um excelente condutor eléctrico, para além de apresentar grande resistência mecânica e resistência ao choque térmico.
Estas características tornam-no extremamente útil em várias áreas da sociedade: produção de cerâmicas ou vidro, na metalurgia ou como lubrificante de maquinaria. Na medicina, outro exemplo, o lítio é utilizado na estabilização de humor em pacientes bipolares.
Nos últimos anos, o que fez disparar a procura de lítio foi a produção, em larga escala, de baterias de iões lítio, muito utilizadas nas mais variadas tecnologias como smartphones, computadores portáteis, tablets ou veículos eléctricos devido à sua leveza e capacidade de recarga. Desde 1991 que este tipo de baterias são comercializadas. De acordo com dados recolhidos pelo Deutsch Bbank, em 2015, o destino para estas baterias foi em 25% para veículos Elétricos, 19% para telemóveis e smartphones e 16% para computadores portáteis.
Extracção de lítio em Portugal
Nos últimos anos, o aumento das aplicações de lítio fizeram aumentar a procura de lítio, a nível mundial. A corrida ao lítio está inserida numa gigantesca campanha internacional em torno das qualidades deste metal, apresentando-o como peça chave para a transição energética. Ou seja, vai-se construindo a ideia de que o lítio é o elemento essencial na descarbonização da economia.
Actualmente, a extracção de lítio no país é realizada em associação com a extracção de outros metais como o feldespato e o quartzo, sendo utilizado na indústria cerâmica como fundente. Ou seja, o lítio é utilizado nesta indústria para baixar a temperatura de fusão da pasta cerâmica, reduzindo o consumo energético.
As minas que actualmente fazem a extracção destes 3 compostos situam-se na Guarda, Ponte de Lima e Boticas, existindo 9 zonas com ocorrência de mineralização de lítio. A exploração dos depósitos minerais de lítio em rochas é um processo de mineração e extracção de inertes em grande escala, sendo necessárias minas a céu-aberto.
Só em 2016, foram feitos 30 pedidos de direito à prospeção e pesquisa de lítio em Portugal.
Consequências da extracção de lítio
De acordo com o Boletim de Minas – Edição especial lítio, o nosso país é, dentro daqueles que compõem a UE, o que possui as maiores reservas de lítio, fundamentalmente nas zonas graníticas do Norte e Centro. Esta mineração causa enormes e irreversíveis prejuízos ambientais.
A extracção do lítio provoca:
- Contaminação dos recursos hídricos, superficiais e subterrâneo;
- Contaminação dos solos e ar por elementos tóxicos;
- Libertação de elevada quantidade de C02 para a atmosfera pela maquinaria utilizada.
Para além destas consequências, há a perda de vegetação e biodiversidade em todas as áreas de extracção e zonas circundantes. O ruído da extracção perturba as populações locais, para além das grandes quantidades de água que serão gastas para a efectiva extracção do lítio.
É por este conjunto de nefastas consequências que as populações afectadas dizem claramente: Não às minas! Sim à vida! O MAS está inteiramente solidário com as populações que se tem insurgido contra as minas e apoia o surgimento de coletivos em torno desta questão. Só a mobilização das populações e a solidariedade entre todos nós, poderá impedir a exploração de lítio no país. O Governo PS, que diz estar interessado em defender o ambiente, tem de anular todas as concessões para a prospeção e exploração de lítio. Não podemos aceitar que o Governo PS e as multinacionais nos imponham o lítio como a solução mágica para a transição energética, quando aquilo que os move são os possíveis lucros de tal indústria extractiva.
As vantagens económicas para os bolsos de alguns, trarão impactos significativos na vida de todos nós. Desenganemo-nos: os profundos problemas ambientais que atravessamos, provenientes sobretudo da exploração de combustíveis fósseis, não poderão ser ultrapassados através da contaminação de recursos hídricos, solos e atmosfera, consequência da exploração do lítio.
O Governo PS e o lítio
Nas últimas eleições, o PS voltou a definir como uma das suas principais prioridades o combate às alterações climáticas. No entanto, para prioridade parece existir muita dificuldade em avançar além da retórica oportunista para arrecadar votos, numa altura em que as questões ambientais mobilizam cada vez mais sectores da sociedade.
O Plano Nacional Energia – Clima (“PNEC”), apresentado pelo executivo, prevê a descarbonização da economia no período de 2021-2030, com o objectivo estratégico de atingir a neutralidade carbónica em 2050. Para começar, estas metas são incomportáveis com o limite ambiental irreversível que estamos à beira de atingir.
De acordo com a estimativa realizada pela Quercus, cada uma das 3 minas já projectadas – Sepeda, Barroso e Argemela – irá emitir um valor de C02 anual igual ou superior à meta de redução com que o Governo se comprometeu. Cada mina irá libertar 1,79 Mt de C02 por ano, significando mais 2,53% de emissões em relação a 2017. Nem as suas próprias metas o Governo consegue cumprir. Se o impacto de cada uma das minas que está, de momento, projectada é suficiente para anular os compromissos estabelecidos no PNEC, como seria se apenas um quarto – um quarto, salientamos – dos 50 pedidos de exploração fossem autorizados? É evidente que a exploração de lítio no país anula por completo as “intenções” do governo para a descarbonização da economia, já de si muito aquém do necessário para a mudança que necessitamos.
Infelizmente nem o PAN, nem o BE têm dado o destaque necessário a esta questão. E quando falam dela, são bastante tímidos. O BE tem-se limitado a dizer que estas não podem ser realizadas em zonas classificadas e o PAN, que nas legislativas não tinha sequer uma posição contrária à exploração de lítio no país, quais ambientalistas, manifesta-se agora contra a “forma” como se tem desenrolado o processo, referindo que são necessários estudos e consultas às populações antes de se conceder a exploração. Lamentamos tamanha ligeireza.
Há dois fortes motivos para sermos absolutamente contra a exploração de lítio: a poluição do ar e contaminação das águas, o que degradará recursos e populações não apenas locais, e a elevada emissão de C02 que a actividade mineira provoca.
Para além disto, o governo quer agora uma refinaria de hidróxido de lítio em Leixões. De acordo com o jornal “Público”, do dia 17/11/2019, João Galamba, Secretário de Estado da Energia, e Pedro Siza Vieira, Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, estão a desenvolver esforços no sentido de atrair empresas para a construção de uma refinaria. Isto obviamente vai servir os interesses das multinacionais australianas e britânicas que querem fazer extracção de lítio no Norte do país.
O compadrio também se quer vestir de verde
Dado ao potencial deste negócio são várias as empresas interessadas, desde estrangeiras a nacionais. A corrida ao lítio nem sempre se faz de forma clara, como ficou patente em Montalegre, onde o Governo decidiu dar a concessão de lítio à empresa Lusorecursos Portugal Lithium, uma empresa formada 3 dias antes de ser assinado o contrato, e com um capital social de 50 mil euros, para um negócio de centenas de milhões. Para além disto, esta empresa tem como funcionário… um ex-Secretário de Estado do Governo PS – Costa Oliveira.
Os governantes e os empresários das “energias limpas” vendem-nos insistentemente as baterias de lítio como a única alternativa aos combustíveis fósseis. O lítio é um dos pilares em que assenta a estratégia do “capitalismo verde”, concebida pelas elites económicas e governantes, com o intuito de nos convencer que estão a ser tomadas medidas para evitar a catástrofe climática. É falso. Ao mesmo tempo, o surgimento de carros eléctricos permitiu dar um impulso à poderosa indústria automóvel que permanecia estagnada há vários anos.
Alternativas às baterias de lítio
Existem alternativas sustentáveis ao lítio, tais como as baterias de iões de sódio e as fuel-cells de hidrogénio. O sódio, altamente abundante, pode ser retirado da água do mar e as baterias terão uma capacidade de armazenamento e carregamento superior às actuais baterias de lítio, bem como um ciclo de vida mais longo. Para além destas vantagens, nas baterias de sódio não há risco de explosão, ao contrário das baterias de iões de lítio.
As fuel-cells de hidrogénio são alternativas para os veículos eléctricos, possibilitando mesmo a produção de energia que necessitam a bordo. Ou seja, produzem energia eléctrica ao juntar o hidrogénio que existe no tanque ao oxigénio retirado do ar, tendo como subproduto do processo água. É urgente a substituição da produção de baterias de lítio pelas baterias de sódio e as fuel-cells de hidrogénio.
Transição energética já!
Ainda assim, não nos basta substituir as baterias de lítio por baterias de sódio ou hidrogénio. É preciso repensar e substituir a forma como nos deslocamos. O automóvel individual privado tem de dar lugar aos transportes colectivos públicos gratuitos e de qualidade. Esta mudança é fundamental mas não se fará com os actuais interesses privados a gerir recursos fósseis e meios de transporte. As indústrias de energia fóssil, assim como as energias renováveis e indústria automóvel e de transportes têm de estar sob propriedade pública. Esta é a única forma de planear convenientemente o nosso futuro.
A mudança é inadiável, não podemos aguardar mais. Os nossos governantes e multinacionais preferem assegurar o lucro de hoje em detrimento do amanhã de todos nós. Precisamos de uma imediata descarbonização da economia.
Pedro Castro
Fotos:
Manifestação em Montalegre, no dia 25 Janeiro 2020, dos movimentos contra a exploração do lítio a nível nacional.
Referências:
https://www.lneg.pt/download/13166/i015115.pdf
“O custo ambiental do lítio português” – relatório Quercus , Agosto de 2019
“Obtenção de Concentrados de Lítio a partir de Diferentes Minérios Portugueses” – Boletim de Minas 2017-2018 – LNEG