Estes três dias, Portugal conta com uma paralisação geral dos clínicos de cuidados de saúde primários, hospitalares e saúde pública que, a julgar pelos primeiros números, contam com uma grande adesão.
A raíz desta greve está no desinvestimento na Saúde, iniciado de forma brutal no período da Troika e a que o presente Governo tem dado continuidade, sem qualquer aumento palpável no orçamento da Saúde e sem qualquer virada que se veja na página da austeridade.
Para os profissionais significa a continuidade dos horários incompatíveis com a capacidade de tratar e salvar vidas, incompatíveis com a sua própria saúde, vida pessoal e familiar. Significa uma crescente precariedade e indiferenciação, como demonstra, por um lado, o número de indiferenciados, sem especialidade, a trabalhar no SNS e, por outro, o aumento de cerca de 40% a trabalhar no sector privado. Para os utentes e doentes significa tempos de espera inaceitáveis para consultas, cirurgias ou procedimentos urgentes. Significa espaços físicos sobrelotados e inadequação de meios materiais com que são tratados.
Entre outros aspectos, reivindica-se uma redução do trabalho extraordinário obrigatório das 200 para as 150 horas anuais ou a redução do horário, em urgência semanal, para as 12 horas, libertando tempo para consulta, enfermaria e bloco. Portugal é o campeão da OCDE em taxa de uso dos serviços de urgência pela população. Não porque a sua população seja especialmente acometida de doença aguda, mas porque não encontra resposta atempada nos cuidados primários e nas consultas externas.
Reivindica-se ainda a contratação, via concursos públicos, para recém-especialistas, que são confrontados, pelas administrações hospitalares, após 6 anos de licenciatura mais 5-7 anos de formação pós-graduada, com contratos de prestação de serviços (leia-se, recibos verdes) que os empurram para o sector privado ou para a emigração. Face à escassez que estas ausências originam, a resposta para “tapar buracos” das escalas é o recurso à contratação de tarefeiros via empresas privadas de trabalho temporário que ficam com uma grande fatia do que o erário público lhes paga para empregarem profissionais à peça, ou, o recurso à pressão sobre os profissionais contratados para fazerem jornadas contínuas de 16 e 24 horas!
Se o país cresceu, quero os meus direitos de volta! Não podemos permitir que Centeno salve a banca enquanto deixa definhar o SNS! Por um SNS de qualidade, universal e gratuito! Direitos para quem trabalha, saúde para quem cuidamos!
André Traça, Médico