O caso da duplicação de abonos de transporte para os deputados das regiões autónomas já fez uma baixa. O deputado Paulino Ascensão, do Bloco de Esquerda, demitiu-se esta segunda feira por considerar que esta prática seria incorrecta, e vai proceder à devolução da totalidade do valor do subsídio de mobilidade que recebeu, ao ter pedido o reembolso da quase totalidade do valor dos bilhetes para os quais já tinha recebido um subsídio de deslocação de 500 euros semanais. O Presidente do PS e líder da bancada socialista, Carlos César, um dos visados nesta situação, diz que a duplicação de apoios de deslocação aos deputados das ilhas é “legal” e “eticamente irrepreensível”. Por sua vez, Ferro Rodrigues, Presidente da Assembleia da República, afirma que os deputados não infringiram nenhuma lei nem nenhum princípio ético.
Neste caso, em que estão envolvidos cinco deputados do PS, um do PSD e um do BE, mais até do que a legalidade ou não desta situação, e se é legal a lei tem de mudar pois é inaceitável, o que deve estar verdadeiramente em discussão são os privilégios e benefícios que os políticos têm por ocupar determinado cargo e a diferença que isso representa em relação às condições de vida da população, num país, que ao contrário do que anunciam, ainda não virou de todo a página da austeridade.
Um deputado na Assembleia da República recebe 3.189€ mensais, mais 325,88€ em despesas de representação, caso esteja em regime de exclusividade, acrescido de subsídio de deslocação e outras regalias como comunicações e saúde. Estamos a falar de quase o triplo do salário de um quadro médio em Portugal (1.200€), uma realidade totalmente diferente da maioria dos portugueses e que cria um afastamento e uma certa indiferença pela condição de vida da população. Este afastamento é bem patente nas palavras de Francisco Assis quando, respondendo a críticas sobre a renovação da frota automóvel, disse que “qualquer dia querem que o presidente do grupo parlamentar do PS ande de Clio quando se desloca em funções oficiais” ou, mais recentemente, na batalha travada por alguns deputados na justiça por causa da manutenção das suas reformas vitalícias, ao fim de 8 anos de mandato, algo que toda a população considera insultuoso mas que também foi taxado de legal, moral e eticamente irrepreensível. Enquanto isso o país ainda espera pela tão falada recuperação de direitos e pelo prometido salário mínimo de 600€ que, apesar de insuficiente, ainda é uma miragem até ao ano das eleições legislativas.
O MAS tem tido como uma das suas linhas orientadoras, desde a sua criação, o fim das mordomias e privilégios dos políticos e dos partidos, propondo acabar com as reformas vitalícias dos deputados, acabar com a imunidade parlamentar, acabar com o financiamento público dos partidos políticos ou instituir salários dos deputados iguais a um salário de um professor ou operário especializado. Em contrapartida, propomos medidas concretas para melhorar as condições de vida de quem trabalha, como o aumento do salário mínimo que, mesmo após três Orçamentos do Estado de um governo que se diz de esquerda, ainda não alcançou os 600 euros.
Para os políticos que nos têm governado e nos têm exigido tantos sacrifícios, deveriam ser eles os primeiros a dar o exemplo, ao invés de se aproveitar da sua posição para retirar daí benefícios e proveitos pessoais.
Para além disso e mais importante, o MAS tem exigido que a geringonça cumpra o seu próprio programa e vire, efectivamente, a página da austeridade, coisa que não aconteceu. Para tal é necessária a efectiva recuperação de todos os direitos retirados pela Troika, por condições de vida e de trabalho dignas; um aumento do salário mínimo para 750 euros, que nos permita sair do limiar da miséria; e uma reposição efectiva do investimento nos nossos serviços públicos.
O dinheiro que tem sido constantemente enterrado na banca tem de ser canalizado em favor da melhoria das condições de vida de quem trabalha. Os 10 mil milhões de euros que este governo já injectou na banca portuguesa têm faltado no nosso Salário, na nossa Saúde, na nossa Educação, nos nossos Transportes e em todos os nossos Serviços Públicos. Não se admite que, por exemplo, a ala de pediatria de um dos principais hospitais do país continue miseravelmente a funcionar em pré-fabricados.
Se o país cresceu, queremos todos os nossos direitos de volta!
Nuno Geraldes e Ângela Lima