O direito à habitação é fundamental na vida de qualquer trabalhador/a e/ou estudante, pelo que deve ser ampla e publicamente garantido. O que temos vindo a assistir, nos últimos anos, é ao aumento desenfreado das rendas e do custo da habitação no orçamento mensal de quem vive em Portugal.
Este fenómeno acontece em todo o país. Contudo, é nos grandes centros urbanos de Lisboa e Porto, as maiores concentrações populacionais, onde os valores atingem somas estupidamente altas.
Segundo o INE, as rendas para habitação em Lisboa custam 42% mais que no Porto. O valor mediano das rendas de alojamentos familiares com novos contratos de arrendamento no Município de Lisboa foi o mais elevado a nível nacional, atingindo 9,62 euros por metro quadrado, mais do dobro do valor mediano nacional, que é de 4,39 euros por metro quadrado.
Nos últimos anos e, principalmente, no último ano, não cessam as histórias e noticias na imprensa sobre a expulsão dos antigos moradores nas cidades e bairros históricos para as periferias da cidade. Os preços astronómicos que se praticam nas rendas são quase todos os dias noticiados. Mas desengane-se quem pensa que o aumento dos custos com habitação se dá apenas nos centros das grandes cidades. A notícia recente da notificação de despejo de 4 prédios, onde vivem 150 famílias (cerca de 400 pessoas), em Santo António dos Cavaleiros, em Loures, é disso exemplo.
A seguradora Fidelidade, proprietária dos prédios, decidiu que a vida de 150 famílias não valem nada perto dos milhões que pondera arrecadar. Deste modo, notificou as famílias, que teriam 120 dias para saírem das suas casas. No bairro 6 de Maio, na Amadora, a Câmara Municipal da Amadora (CMA) tem vindo, ao longo dos anos, a desalojar famílias e a destruir as suas casas com o intuito de fazer “render” aqueles terrenos, pois são bastante apetecíveis para o sector da construção, dado estarem próximo de Lisboa e de transportes públicos (Metro Reboleira e Estação CP Damaia e Reboleira). Assim, a CMA, governada pelo PS, trata de retirar a população que ali vive, demonstrando um profundo desprezo pelo direito à habitação e um racismo institucional sem vergonha.
Dado o aumento dos custos com habitação e os baixos salários, verificou-se que, nos primeiros nove meses de 2017, foram despejadas, em média, 5,5 famílias por dia. Além disso, Portugal é um dos países da UE nos quais o preço do imobiliário mais subiu em 2016 – 7,9%. Importa perguntar: o que se passa para justificar um aumento tão grande das casas, rendas e, consequentemente, dos despejos, que colocam preços inatingíveis para quem vive e trabalha em Portugal?
Quais as razões para o aumento das rendas?
Um dos principais fatores é a lei que acabou por ficar conhecida como “lei dos despejos”, por liberalizar o mercado de arrendamento e permitir aumentos astronómicos nas rendas dos contratos mais antigos, quase sempre incomportáveis para reformados, pensionistas, trabalhadores com baixos rendimentos, pequeno comércio ou coletividades. Esta lei foi uma iniciativa do Governo de Passos Coelho e de Paulo Portas, e mais especificamente da então ministra do CDS-PP, Assunção Cristas.
Outro factor é o aumento do turismo em Portugal. Não somos contra o turismo, mas somos contra o turismo de massas em função do lucro e benefício de uns poucos em detrimento de uma larga maioria de quem vive nas cidades. Os poucos beneficiados são os especuladores do imobiliário e dos grandes grupos económicos do sector. Os muitos prejudicados são a maioria da população que vive do seu trabalho e das suas reformas.
Em Lisboa, a Câmara Municipal, governada pelo PS, nos últimos 10 anos, tem sido um dos cúmplices desta mudança. O aumento do Turismo exponencial beneficiou apenas os grandes grupos imobiliários, turísticos, especuladores e seguradoras. A especulação imobiliária, o empreendimento turístico dos AirBnB, hotéis e albergues pressionam as rendas e o preço das casaspara cima, pois o alojamento local e a venda de casas a ricos de outras partes do globo é mais rentável.
É ainda importante referir que os trabalhadores do sector do turismo em nada beneficiaram com o crescimento deste sector. Basta ver que os salários praticados no sector rondam o salário mínimo e que as suas condições de trabalho continuam igualmente precárias.
Por outro lado, não se compreende como é que o BE decidiu conformar, com o PS, parte do executivo que governa a Câmara Municipal de Lisboa, perante um projecto deste género. Mesmo com o pelouro dos transportes, o BE não parece estar determinado em contrariar a pressão do turismo. Os transportes de Lisboa funcionam cada vez mais em função do turismo que propriamente em função do movimento que a população precisa fazer entre a sua casa e o seu trabalho ou local de estudo. O que temos visto é o reforço de transportes em função dos grandes acontecimentos que mobilização massas de turistas na cidade de Lisboa. Ou, se olharmos para as alterações que estão a ser desenvolvidas no Metro de Lisboa verificamos que se dá privilégio à fácil deslocação dentro da cidade, principalmente feita por turistas, e nenhuma importância à extensão da linha do Metro de Lisboa para as periferias da cidade, feita por quem mora e trabalha na cidade.
Os vistos Gold, introduzidos pelo Governo PSD/CDS, contribuíram igualmente bastante para o aumento da especulação imobiliária, pois convidam à entrada de especuladores no país. Ou seja, o facto de os vitos Gold permitirem a entrega de vistos de residência europeus em troca de compras imobiliárias, acima de 500 mil euros, foi um chamariz para os especuladores imobiliários.
Não sendo os únicos factores, estes são três dos principais que explicam o aumento do custo da habitação em Portugal. A direita, aliada à Troika, operou uma mudança no país tornando-nos mais dependentes e um país virado para o turismo. Contudo, o PS não tem as “mãos limpas”, pois foi cúmplice, na cidade de Lisboa, com a facilitação da especulação imobiliária e dos grandes interesses do turismo. Além disto, o Governo PS, apoiado pelo PCP e BE, não reverteu a lei das rendas da direita nem acabou com os Vistos Gold!
É importante que BE e PCP se apoiem nas reivindicações e mobilização de quem habita e trabalha nas grandes cidades para reverter estas leis! Queremos ter o direito a habitar as nossas cidades! Queremos os nossos direitos de volta!
Tiago Castelhano