Há mais de um ano que os enfermeiros lutam contra a divisão da carreira e o novo sistema de avaliação, e, greve a greve, manifestação a manifestação, a adesão destes trabalhadores da saúde vem sendo cada vez maior.
Depois da primeira manifestação, em Outubro de 2008, com cerca de dois mil enfermeiros, das greves com mais de 80% de adesão em Fevereiro, Abril e Maio de 2009, os enfermeiros mostraram ao longo destes últimos três dias de greve que não vão baixar os braços contra os ataques do governo.
Durante estes três dias a greve teve uma adesão superior a 85% em hospitais, centros de saúde e unidades de saúde familiar, chegando aos 100% de adesão em cerca de 23 hospitais, entre os quais São José, Covilhã, Leiria, IPO de Coimbra e Porto, e as maternidades Júlio Dinis (Porto), Daniel Matos e Bissaya Barreto (Coimbra).
No segundo dia de greve foram várias as manifestações regionais protagonizadas por enfermeiros, ao longo do país: concentrações de enfermeiros em frente a vários hospitais e marchas lentas de enfermeiros fizeram parar o trânsito em Faro, Porto e Braga.
Milhares de consultas e cirurgias foram canceladas e adiadas. Os hospitais e centro de saúde tornaram-se um autêntico caos, demonstrando claramente a importância fundamental destes profissionais em todos os serviços de saúde.
Por fim, no último dia de greve, a maior manifestação de sempre desta classe profissional. Cerca de 17 mil enfermeiros, quase metade de todos os enfermeiros do país (tendo ficado muitos retidos nos hospitais para a prestação dos cuidados mínimos), caminharam desde o Ministério da Saúde até ao Ministério das Finanças, demonstrando claramente a união e força da classe.
As reivindicações
Ainda antes do inicio da greve, provavelmente prevendo o seu grau de adesão, o Ministério da Saúde recuou nas propostas que constituíam os principais motivos de protesto declarados no pré-aviso de greve. Ainda assim a greve manteve-se.
As principais reivindicações do sindicato prendem-se principalmente com a grelha salarial proposta pelo governo. No pré-aviso de greve constavam essencialmente como objectivos as injustiças salariais, como durante os próximos quatro anos os enfermeiros continuarem a ingressar na carreira no nível de bacharel, quando são licenciados.
Para além da grelha salarial, os sindicatos contestam a proporção de Enfermeiro para a categoria de Enfermeiro Principal, apesar da grande maioria dos enfermeiros ainda não aceitar a divisão da carreira em duas categorias.
De forma muito semelhante ao “Memorando de Entendimento” assinado pelas direcções de sindicatos dos professores, as direcções sindicais dos enfermeiros assinaram um acordo com Ministério da Saúde, em Agosto do ano passado que previa a divisão da carreira de enfermagem, a grande bandeira de luta dos milhares de enfermeiros que fizeram greves e manifestações com adesões históricas.
Esta traição foi justificada pelo sindicato como sendo um recuo táctico (a um mês das eleições legislativas, quando o governo fazia de tudo para que greves e manifestações não ofuscassem a campanha eleitoral). O que vemos agora é que o recuo táctico passou a ser definitivo e as direcções sindicais apenas exigem um melhor rácio nas duas categorias.
A luta daqui para a frente
O ataque à Função Pública, por meio da lei 12A/2008, foi semelhante para todos os sectores: professores, enfermeiros, administração pública, auxiliares de acção médica, técnicos de diagnóstico e terapêutica, médicos, etc. No entanto, a resposta tem sido parcelar. Neste momento a união de todos os sectores da função pública é fundamental para acabar com as divisões de carreiras, quotas nas avaliações, grelhas salariais injustas, contratos de trabalho precário, entre outros ataques.
No que respeita exclusivamente aos enfermeiros, a ministra Ana Jorge já se mostrou disponível para retomar as negociações. Em resposta, as direcções sindicais afirmam que estão dispostas a prolongar as acções de luta se as suas reivindicações não forem ouvidas, estando já planeada uma greve dos enfermeiros às cirurgias programadas. Apesar de ser apenas uma parte da classe em greve, esta acção é muito progressiva dado que pressupõe que os restantes enfermeiros quotizem parte do salário para os enfermeiros em greve.
Mesmo que as exigências dos sindicatos sejam ouvidas, manter-se-á a divisão da carreira em duas categorias – nesse caso, o que farão as direcções sindicais? Será que, à semelhança do processo de luta dos professores, será necessária a criação de movimentos independentes de enfermeiros que, à margem das direcções sindicais, dirijam a luta dos enfermeiros no sentido de fazer ouvir todas as reivindicações dos enfermeiros e não só a parte que mais convém?
Diana Curado