autarquicas_diferenciais

O Governo perde mas ninguém ganha, uma outra visão das autárquicas

Infelizmente o país parou para as eleições autárquicas de 29 de Setembro. Dizemos infelizmente porque todos os partidos, sobretudo Bloco de Esquerda e PCP, desistiram da luta de rua momentaneamente para apostar nas eleições. O Governo foi derrotado nestas eleições, mas há um ano foi derrotado com mais força nas ruas, nos dias 15 e 29 de Setembro. Nessa altura recuaram com a TSU, agora avançam com mais austeridade.

Posto isto, aconteceu o esperado: as eleições resultaram numa grande derrota do governo. Esse resultado, a vitória eleitoral da CDU, o desaire do BE e as vitórias de algumas candidaturas “independentes” foi o mais falado nas notícias. Estes factos, sendo verdadeiros, escondem que o PS, face a 2009, perde  270.000 votos. Escondem também que a vitória da CDU é pequena, pois passa de 9,75% para 11,09% e só “pesca” 12 mil dos quase 900 mil votos que a direita, o PS e o BE perdem. O aumento da abstenção, dos votos brancos e nulos também escapou à maior parte das análises.)

O Governo é o grande derrotado mas o PS não cresce

Comecemos pelo grande derrotado, o PSD e o governo. Se somarmos as várias coligações com os partidos do governo, assim como os votos de PSD e CDS contamos uma perda de 558 mil votos face a 2009 e de um milhão face às legislativas. O governo viu nestas eleições, de novo o cartão vermelho, mas só com a luta nas ruas é que o pomos fora de jogo.

Já o PS não ganha com a derrota da direita. Onde obtém vitórias significativas – em Lisboa e no Funchal, onde integrou a coligação “Mudança” – é onde menos surge ligado a Seguro. É verdade que ganhou em número de Câmaras, porém isso acontece derivado do ódio popular ao PSD, restando o PS como mal menor. A perda de cidades como Braga, Beja, Loures ou Matosinhos e não ter reconquistado Faro numa situação muito favorável mancham a “grande vitória do PS”. Só António Costa consegue contrariar esta tendência por fingir estar pouco ligado à direcção do PS, embora faça parte dela.

A queda de PSD e PS mostram que povo está farto do “centrão”. PS, PSD e CDS perdem quase 900 mil votos face às autárquicas de 2009. A desgraça é que a esquerda, BE e PCP, não querem ser alternativa e mantém-se divididos, entregando o país nas maõs dos mesmos de sempre.

E a esquerda também não tem grandes vitórias

A CDU parece a grande vencedora destas eleições, por ganhar 34 câmaras, recuperando bastiões como Beja, Évora ou Loures. Porém subiu menos de 12.000 mil votos. Ou seja, a CDU ganhou menos do que perdeu o BE. Nas actuais condições políticas, com o descontentamento com o governo que não é capitalizado pelo PS e com grandes manifestações e greves a marcarem os últimos anos, seria “de esperar” que a CDU desse um salto mais significativo. O PCP já não entusiasma muitos e paga o preço do seu paulatino calendário de oposição e mobilização de rua, que de tão paulatino, tem deixado Passos e Portas no poleiro.

Além do Governo, o Bloco de Esquerda é o maior derrotado destas eleições, que desce de 3 para 2,4%, caindo de 167 para 121 mil votos,  é a sua quinta derrota eleitoral seguida. Na sua primeira eleição como dirigente máximo, Semedo falha o objectivo de ser eleito vereador por 52 votos. Apesar da margem insignificante, no actual contexto de descontentamento, beneficiando de não haver uma pressão para o “voto útil” em Lisboa, o BE tinha obrigação de fazer mais. Como se não bastasse o BE perdeu a única Câmara que tinha. O BE paga pelos seus “zigs-zags” políticos, por se aproximar constantemente do PS  – ainda nestas eleições, José Soeiro, candidato ao Porto, disse que o BE era importante para “desempatar” entre PS e a direita. O BE fica a meio caminho, nem se aproxima do PCP para criar uma coligação que pudesse derrotar a direita e o PS, nem se alia ao PS, apesar de Semedo se mostrar aberto a isso, porque sabe que ia queimar-se com essa aliança.

Eleitores fogem aos partidos tradicionais

A outra novidade foram as listas ditas independentes, que tiveram no total 7%. A vitória no Porto do “independente” Rui Moreira, assim como a de Isaltino Morais em Oeiras foram os resultados mais visíveis. É certo que nenhum destes é verdadeiramente “independente”, mas como aparecem vindos de fora dos habituais partidos, o povo preferiu  castigar o governo com o voto nos independentes do que “nos partidos”, fosse a esquerda ou o PS. Por outro lado surgiram também sectores independentes pela esquerda, como o movimento Cidadãos por Coimbra que mostram que a esquerda, ao aliar-se contra o governo é mais forte. Mais seria de além de BE, independentes e MAS, juntasse também a CDU. Com a esquerda dividida, o desgaste do governo enche de votos os falsos independentes.

Vários comentadores mostraram-se felizes com a votação da CDU. Tomemos como exemplo Pedro Marques Lopes, do “Eixo do Mal”, programa da SIC Noticias, que dizia: “E vencedores, tenho que dizer, foi o PCP o que mostra que Melo Antunes tinha razão quando dizia, é um partido fundamental à Democracia portuguesa. Consegue institucionalizar o protesto(…) os votos ficaram no sistema”. Pedro Marques Lopes vê bem o papel do PCP, não vê é que este teve uma vitória pequena face à gigantesca perda de 850 000 votos do PSD-CDS e PS (o PCP aumenta apenas 1% desse número em votos). O maior aumento foi o dos votos nulos e brancos que juntos tiveram 7%, assim como as candidaturas independentes. Também a abstenção cresceu 7%. A insatisfação popular parece não ficar nos partidos tradicionais e procurar outras alternativas. Se a esquerda anti-troika se unisse, em torno de uma coligação PCP-BE, a história seria diferente e o governo e o PS teriam um susto. Como a esquerda prefere ficar dividida e institucionalizar o protesto, o governo dorme, por agora, descansado. Para que não seja assim resta construir um partido diferente, por um novo 25 de Abril, o MAS.

Anterior

Economia à beira do abismo. Demos um passo em frente?

Próximo

Eleições autárquicas em debate em Braga