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Cavaco satisfez os mercados

O novo/velho Governo de Passos e Portas foi (re) empossado pelo emérito Presidente da República (PR), e os mercados ficaram satisfeitos, embora o Governo esteja tão frágil quanto antes. Eis a conclusão retirada de todo este processo, em que durante semanas Cavaco Silva colocou o país quase sem governo. Imediatamente após o anúncio do PR, no qual este afirmou que o Governo iria manter-se em funções sem a solução de “salvação nacional”, embora remodelado, os juros da dívida começaram a descer.

E hoje, cinco dias depois da comunicação feita, pode ler-se no jornal Público: “O principal índice da bolsa portuguesa, o PSI20, abriu nesta quinta-feira a subir 0,21%, para os 5.749,33 pontos. Na quarta-feira, o PSI20 encerrou a sessão a ganhar 1,5%, para 5.737,25 pontos, em linha com as principais praças europeias, com o BPI e o BES a liderarem as subidas.” De facto, os mercados ficaram mesmo satisfeitos. Resta saber como ficarão os trabalhadores com as novas medidas de austeridade que serão impostas brevemente, no seguimento do cumprimento dos acordos com a Troika.

Apesar de tentar dar uma aparência de suprapartidário, com o seu apelo a uma “salvação nacional”, Cavaco demonstra agora que tudo não passou de um esquema pensado para que tudo ficasse na mesma. O Presidente da República procurou desde sempre agradar aos ditos mercados, que não são uma entidade estratosférica, sem existência, mas sim os grandes banqueiros e grupos económicos.

Contudo, esta contradança teve os seus efeitos secundários, deixando o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas altamente fragilizado. O povo assistiu incrédulo, perante tamanha desfaçatez, a todo este filme.

Vejamos ainda quem Passos e Portas (de acordo com Cavaco) escolheram para colocar como novos ministros…. mais do mesmo. Pires de Lima, Moreira da Sila e Rui Machete. Este último altamente ligado ao caso de corrupção do BPN, no qual o Estado Português já injectou mais de 4 mil milhões de euros (e pode ir mais longe) e que foi um dos factores responsáveis pelo aumento exponencial da dívida portuguesa.

Perante este cenário, e ao contrário do que diz o Governo e Cavaco Silva, eles não estão do lado do povo, mas sim do lado dos acordos internacionais, do lado da austeridade e do lado da corrupção. Cavaco está interessado em que os cortes se mantenham e está do lado da direita. Estão do lado de quem entende que criar miséria, desemprego, exploração e opressão é a solução para o país. Apesar de todo o descontentamento popular demonstrado pelo povo, que desde que este Governo tomou posse, já saiu às ruas massivamente mais do que uma vez, Cavaco Silva decide manter o Governo.

Mas a podridão não fica por aqui. Na passada quarta-feira, o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, disse que «se Portugal cumprir o programa de ajustamento económico e financeiro ligado à ajuda externa e se “não houver acidentes políticos”, poderá voltar a financiar-se “autonomamente” nos mercados em 2014 (…) se há uma lição a retirar da recente crise política em Portugal (…) é que a instabilidade afecta gravemente a confiança e que, quando a confiança é posta em causa, há também consequências imediatas em termos económicos e financeiros. Espero, pois, que agora se juntem as diferentes forças políticas portuguesas na execução do programa, que é exigente mas que é indispensável para o regresso de Portugal aos mercados» (Público). O que Barroso quereria dizer com “acidentes políticos”? Novas manifestações como o 15 de Setembro ou o 2 de Março? Barroso deixa claro que, para que os banqueiros e grandes grupos económicos continuem a lucrar, é urgente manter a austeridade e, para tal, é também urgente manter a estabilidade (deles, a nossa, de quem trabalha, pode ser destruída com desemprego e cortes atrás de cortes), ou seja, não haver manifestações de grandes dimensões para que o Governo possa exercer as suas funções em paz.

PS: lobo com pele de cordeiro

O lobo com pele de cordeiro que desde o 25 de Abril existe em Portugal, continua a desempenhar o seu papel. Se por um lado rejeitou a “salvação nacional” e diz rejeitar a austeridade, por outro, António José Seguro quer manter os acordos internacionais. Vejamos o que diz o PS sobre a privatização dos CTT: «É mais uma negociação directa, particular, que não tem a transparência necessária para ser feita por concurso internacional. Esta é uma empresa que dá lucro. O PS tem defendido que todos estes processos de privatização deviam ser revisitados, à luz de uma actualização do memorando de entendimento (com a troika)» (Público). Ou seja, se por um lado se diz contra a privatização dos CTT, por outro diz que este processo deve ser “revisitado à luz de uma actualização do memorando de entendimento“. Mais claro: o PS não diz “não à Troika”, apenas se limita em dizer que quer renegociar os acordos, quando sabe perfeitamente que isso não é possível a não ser para manter a mesma estratégia.
Afinal, em que ficamos? Embora queira dar um ar de partido de esquerda, a história tem provado que o PS (principalmente a sua direcção) há muito não o é. Já não está do lado dos trabalhadores e nem sequer em cima do muro, está do lado dos mercados. Por isso, o PS não é alternativa, será mais do mesmo. E por isso Seguro é tão parecido com Passos.

BE E PCP “cada um na sua bicicleta”, esperam as autárquicas

Perante o actual cenário, e sem fortes mobilizações, o descontentamento popular será canalizado para as eleições autárquicas. Será uma altura muito importante para que o povo, através do seu voto, expresse o seu repúdio ao actual estado do país. Contudo, isso não basta. E também não basta que BE e PCP apenas proponham como saída para a queda do Governo as eleições legislativas antecipadas. Claro que a demissão do governo e a consequente convocação de eleições antecipadas serão muito importantes mas, mais uma vez, à semelhança das autárquicas, não bastam. Além de que não basta chamar a eleições antecipadas, quando depois não se propõem uma alternativa de esquerda clara, ou um verdadeiro governo de esquerda alternativo, de ruptura com a austeridade, os cortes salariais e das pensões, para por fim ao desemprego. Mas como alcançá-lo? Por isso desafiamos o PCP e o BE, socialistas contra a austeridade e todos aqueles que querem, de facto, romper com a Troika e questionar a ditadura da dívida que paira sobre os sucessivos orçamentos de estado.

Mas primeiro que tudo será necessário que o povo saia à rua massivamente – tal como no 15 de Setembro de 2012 e à semelhança de outros países como o Egipto ou o Brasil- a demonstrar a força de milhões nas ruas e a exigir a saída da Troika de Portugal e o fim da austeridade, para que a mudança seja possível.

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