BPN: até quando a impunidade?

A SIC revelou numa reportagem transmitida no dia 22 de dezembro que o buraco do BPN pode chegar aos 7 mil milhões de euros. A responsabilidade por grande parte desse montante é dos amigos dos administradores do banco antes da sua nacionalização, empresários e políticos dos partidos do regime, principalmente do PSD, que compraram e venderam ações do BPN sem nunca as pagar e obtiveram créditos sem apresentar garantias. Entre os devedores estão políticos como Arlindo de Carvalho, ministro da Saúde nos dois governo de Cavaco Silva, que, junto com José Neto, ligado ao PS e seu sócio na imobiliária Pousa Flores, deve ao BPN, e agora ao Estado, mais de 74 milhões de euros.

Toda a dívida do BPN está a ser suportada não pelos que a contraíram e utilizaram o banco como uma plataforma de enriquecimento ilícito, mas pelo povo português, depois que essa dívida foi transferida para o Estado. Ela está a ser paga através dos sucessivos pacotes de austeridade do governo Sócrates e, agora, pelo roubo de salários, pensões, reformas e direitos executado pelo governo de Passos Coelho/Paulo Portas e da troika.

Nessa transferência da dívida do BPN para o Estado português está uma das explicações do salto no crescimento da dívida pública a partir de 2008. Em novembro de 2008, o governo Sócrates nacionalizou esse banco, apesar de saber que acumulava prejuízos asfixiantes para os cofres públicos, e injetou nele 600 milhões de euros para impedir que fechasse as portas. Menos de três anos depois, em julho do ano passado, o governo de Passos Coelho o vendeu por 40 milhões ao banco angolano BIC.

Mas o péssimo negócio, para o Estado, fechado entre o governo e o BIC não se limitou a vender por 40 milhões um banco em que tinha investido 600 milhões. Segundo a reportagem da SIC, uma das condições impostas pelo BIC para comprar o banco foi ficar apenas com a sua parte sadia; as empresas financeiras do grupo BPN, os seus imóveis e os créditos de cobrança difícil, no valor de mais de 5 mil milhões de euros, uma parte dos quais considerada impagável, teriam de ficar com o Estado, isto é, com o povo português. E assim foi.

Só para relembrar, o BPN foi presidido durante quase toda a sua existência por Oliveira e Costa, militante do PSD e Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do governo Cavaco Silva. Do governo Cavaco Silva, nesse caso como ministro dos Assuntos Parlamentares, também fez parte Dias Loureiro, ex-secretário-geral da Comissão Política Nacional do PSD, igualmente envolvido no caso BPN, como administrador da Sociedade Lusa de Negócios (SLN), de propriedade do banco, da qual pediu demissão em 2009, após a divulgação de negócios ilegais em Porto Rico e Marrocos.

A dupla Dias Loureiro e Oliveira e Costa também estaria envolvida, segundo o jornal Correio da Manhã (19/5/2012), desta vez junto ao banqueiro angolano Álvaro Sobrinho, do BES Angola, numa rede de lavagem de dinheiro controlada pelo empresário Michel Canals, ex-gestor de contas do banco suíço UBS para o mercado português. Segundos fontes judiciais do jornal, estaríamos “perante um ‘verdadeiro polvo’ com ramificações que podem abanar o sistema partidário, visando personalidades ligadas ao PSD e PS”.

E não se pense que depois de tudo isso ambos não continuem a manter o seu prestígio dentro do PSD. Pacheco Pereira, no programa da SIC Notícias “Quadratura do Círculo” informou que Dias Loureiro é um dos conselheiros de Passos Coelho. O banqueiro acusado de corrupção seria mesmo, segundo fonte do Correio da Manhã, “o ídolo de Miguel Relvas”.

O lixo

Os 5 mil milhões de ativos tóxicos herdados pelo Estado português do BPN ficaram alojados em três empresas criadas para esse fim. A SIC teve acesso a um pacote de cobrança difícil que o governo entregou à Parvalorem, uma dessas três empresas. Em setembro de 2012, o valor total das dívidas alojadas na Parvalorem ultrapassavam os 4 mil milhões de euros. Desse total, 1,7 mil milhões de euros são considerados incobráveis, isto é, não serão recuperados e aumentarão o défice público. A reportagem da SIC divulgou os nomes de alguns dos devedores que estão em incumprimento e o valor que devem.

Entre eles está o próprio Oliveira e Costa, com um montante superior a 15 milhões de euros; a sua filha, Iolanda Oliveira e Costa, com um crédito de 3,4 milhões; Luis Caprichoso, número 2 de Oliveira e Costa na administração do BPN e da LSN; e a Labicer, uma empresa da área da cerâmica, ligada a Oliveira e Costa e Luis Caprichoso, cuja dívida ultrapassa os 82 milhões. As offshores criadas por esses dois para branquear os empréstimos feitos às suas empresas e amigos devem cerca de 218 milhões de euros.

Duarte Lima, titular da Homeland, um fundo de investimento imobiliário, deixou uma dívida de quase 50 milhões de euros. Esse ex-deputado do PSD foi líder da sua distrital de Lisboa até 2000 e é acusado de assassinato de uma milionária no Brasil.

A SIC divulgou muitos outros nomes de empresários e empresas donos de dívidas com o BPN, quase todos eles militantes do PSD e ligados ao presidente Cavaco Silva. Para abreviar, citemos Joaquim Coimbra, dirigente nacional do PSD nos tempos de Durão Barroso e membro da comissão de honra da última candidatura presidencial de Cavaco Silva, cuja dívida ascende a mais de 11 milhões; e Fernando Fantasia, que terá negociado o terreno onde o presidente da República construiu a sua casa de férias, que deve mais de 200 milhões de euros.

Até agora, a Parvalorem só recuperou 131.903 milhões de euros, uma gota de água no oceano de uma dívida de 4 mil milhões, como concluiu a reportagem da SIC. Os grandes montantes não estão a ser recuperados, mas renegociados. No processo aberto há dois anos para esclarecer o escândalo do BPN, envolvendo crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influência, só foram ouvidas 12 das mais de 300 testemunhas chamadas a depor. Atualmente ninguém está preso: apenas Oliveira e Costa e Duarte Lima estão em prisão domiciliar com pulseira eletrónica.

O caso BPN desmascara o discurso de que o povo viveu acima das suas possibilidades. Quem viveu assim foram os banqueiros, políticos e empresários do regime (PS, PSD e CDS-PP), cujas atividades ilícitas serviram para aumentar a dívida pública que hoje nos obrigam a pagar. Revela também o grau de corrupção e banditismo que envolve os políticos do regime e o sistema financeiro.

Esta é mais uma razão para lutarmos para que esses políticos e empresários corruptos sejam presos e obrigados a pagar as suas dívidas, através da expropriação dos seus bens; para demitir o governo Passos Coelho; para expulsar a troika e suspender o pagamento de uma dívida que não fomos nós que fizemos e que nos está a condenar ao desemprego e à fome e a arruinar o país.

Cristina Portella

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